A igreja deve se envolver na problemática das drogas. Dependentes Químicos não conseguem deixar o vício sozinhos, e as congregações podem ajudar – e muito – neste processo
por Renata Galdino
Entrar nas drogas é fácil. Mas sair delas… Aí é que tudo complica. Agora, façamos uma reflexão: se um viciado em entorpecentes procurar ajuda em sua congregação, você estaria preparado para lidar com ela? Apto a dar alimento espiritual e orientar quanto aos problemas físicos causados pelas drogas, encaminhando para tratamento?
“A igreja negligenciou o tema por muito tempo. Recebia como membro um alcoólatra, mas não fazia trabalhos direcionados para ele, talvez por não entender e não parar para entender como isso deveria ser feito. E até hoje ainda são poucas as igrejas que falam sobre drogas no altar, acham que o tema é pouco importante. Mas ele é urgente”, enfatiza o pastor Wellington Vieira, presidente do Centro de Recuperação de Dependentes Químicos (Credeq), atuante em Ravena, distrito do município de Sabará, localizado na Região Metropolitana de Belo Horizonte (RMBH).
Em resumo, a grande maioria das igrejas ainda não está preparada para receber esses novos irmãos. Eles precisam ser acolhidos com amor, com a ministração da Palavra de Deus, mas também necessitam de projetos direcionados a ajudá-los a largarem o vício. “Dependência química não se cura somente com óleo da unção. Corpo, alma e espírito devem ser tratados”, salienta o pastor.
O fotógrafo Emmerson Parreiras Campos, de 40 anos, lamenta não ter encontrado há mais tempo o apoio que precisava para deixar as drogas. “Sem acompanhamento você não consegue largar o vício. Foi muito difícil para mim, eu não tinha força”, reconhece. Ele afirma que, se tivesse sido orientado e encaminhado por alguém na primeira vez que chegou a uma igreja, não teria tido uma recaída.
Emmerson começou a trilhar o caminho das drogas aos 14 anos, na escola. Deu um tempo dos entorpecentes quando começou a namorar, mas voltou ao vício após o fim do relacionamento. Aos 23 anos já fumava crack – a cocaína não mais fazia efeito. “Trabalhava para sustentar o vício”. Aos 33 anos, Emmerson decidiu se internar no Credeq, onde conheceu a Palavra de Deus. Seis meses depois, recebeu alta do centro. “Bati no peito, desafiei Satanás. Disse que ele não tinha mais poder sobre a minha vida”, conta.
Uma semana depois de chegar em casa, ele abriu um bar. Emmerson conseguiu se segurar por um ano e meio, mas teve a recaída após uma briga com a então esposa. Ele não estava usando tóxicos, mas a mulher desconfiou. “Eu não tinha acompanhamento aqui fora, e a única pessoa que estava ao meu lado, com a qual eu podia contar, não acreditava que realmente eu estava limpo”.
No ano passado, o fotógrafo novamente procurou ajuda no Credeq. Ficou no centro de recuperação até o mês de novembro. Nesse período, ele conheceu uma pessoa da Igreja Batista da Lagoinha (IBL), em Belo Horizonte, que o levou para uma célula. Em dezembro, Emmerson passou a ter um acompanhamento, participa dos cultos e faz cursos para crescer no ministério. “Quem salva é Jesus Cristo. Mas é preciso ter um acompanhamento. Se não tiver, quem quer sair do vício não consegue”, reforça o fotógrafo.
SOZINHO? NÃO MESMO
Judenício Dias dos Santos, de 33 anos, o “Binha”, é outro exemplo de que sozinho é praticamente impossível deixar o vício de entorpecentes. “Achei que conseguiria sem a ajuda de alguém, mas não deu. Foram 15 anos nessa ilusão”, comenta o especialista formado em Dependência Química, casado há 12 anos com a pastora Adélia Porto. O casal se conheceu no Credeq quando ela já trabalhava no centro e ele tinha decidido se internar no local para o tratamento contra as drogas. Hoje, Binha também faz parte da equipe.
A mulher foi peça fundamental no processo de cura de Binha. “Ela me ajudou e tem me ajudado muito. Oramos, sete meses depois nos casamos. Moramos nove anos e meio no Credeq, em Ravena, para fazer a obra de Deus”, diz.
Ele começou a usar drogas na escola, aos 11 anos. Binha queria fazer parte da turma e, para isso, experimentou cigarro, maconha e bebida alcoólica. Aos 14 anos já tinha usado cocaína e se enveredava para o mundo do crack. Em 1996 ele chegou a pesar 40 quilos, e a família não tinha esperança de vida para o ente querido. Em 2002, Binha se internou no Credeq. Três meses após dar entrada no centro, participou do “Encontro com Deus”, onde decidiu por aceitar a Jesus Cristo. “Eu sempre ouvia falar do Senhor na clínica, mas nunca dei abertura. Foi aí que a minha vida começou a mudar. Foi Jesus quem me deu a cura e a salvação”.
Binha e a esposa Adélia estão cientes da importância do corpo de Cristo no auxílio aos que desejam largar as drogas. Há três anos, na Igreja Batista Nova Floresta, em Belo Horizonte, eles fazem o acolhimento de pessoas que querem se internar. “Por mais que a coisa esteja terrível, no fim do túnel há uma luz piscando. É Jesus quem vai resgatar essas pessoas do mundo e levá-las de volta para o seio familiar e para perto dEle”, enfatiza.
FAMÍLIA PRECISA SER TRATADA
Para cada um usuário de drogas, existem pelo menos outras dez pessoas sofrendo com o vício dele. “O foco da igreja também deve ser a família”, afirma o pastor Wellington Vieira.
Há 11 anos, Dalveneide Almeida, de 57, é voluntária no Credeq. Ela procurou o centro de recuperação em busca de ajuda para o filho, hoje com 38 anos, usuário de drogas na época. Como ele não quis se tratar, foi Dalveneide que recebeu o tratamento. Ela se converteu ao Evangelho e hoje ela congrega na IBL.
O tempo que passou ajudando outras famílias fez com que a voluntária se mantivesse de pé. “Foi o mover de Deus nesse tempo, a companhia e o apoio de toda a equipe”, conta.
Dalveneide integra a equipe que ministra palestras às igrejas que procuram o Credeq em busca de orientação para iniciar um ministério voltado para auxiliar dependentes químicos. “Se não abraçarmos essa causa, vão morrer muitos meninos no tráfico de drogas. Mas não desistimos nunca”, ressalta.
TV, RÁDIO E ATÉ CULTO
O trabalho do pastor Wellington Vieira com usuários de drogas começou há 23 anos, quando Deus falou com ele para largar tudo o que estava fazendo e cuidar dessas vidas. Na época, ele tinha uma empresa no Barro Preto, na capital mineira.
Mas depois de receber a ordem do Senhor, deixou os negócios e foi com a esposa, Diva Vieira, e os três filhos morar em uma comunidade terapêutica no município de Vespasiano, na Grande Belo Horizonte. A família residiu por lá durante sete anos. Hoje, o Credeq atende a 45 recuperandos na sede do centro, em Ravena, e 25 em Lagoa Santa, unidade que estará em pleno funcionamento até o fim do ano.
O trabalho realizado pela equipe do Credeq vai além das paredes do centro de internação. Em setembro de 2011, a Rede Super passou a exibir o programa “Resgatados” aos sábados, às 17h. O objetivo é mostrar que há uma saída para quem está submerso no mundo das drogas. “Com fé e esperança em Jesus Cristo nada está perdido. A família vê o programa e vê que pode dar a volta por cima”, ressalta o pastor.
Há um ano e meio, foi a vez de abrir o Culto dos Resgatados, que acontece no salão Fé da IBL nas quartas-feiras, às 19h30. É a porta de entrada para quem busca ajuda. “Recebemos pessoas encaminhadas pela Justiça, por pastores. Até agora, mais de cem foram encaminhadas para orientação e tratamento”, diz. Muitos dos que receberam o tratamento voltaram para o culto e até lideram células.
A ferramenta mais recente lançada no trabalho foi o programa “Resgatados” na rádio Super FM, exibido dentro do “Café com Deus”, às segundas, quartas e sextas-feiras, de 7h às 8h. Outro projeto conjunto entre a Batista da Lagoinha e o Credeq: um ônibus e uma Doblò vão com equipe de especialistas até a cracolândia para incentivar os usuários a se tratarem. No dia 10 de agosto, o Credeq participa da 2ª Marcha contra o Crack, em Belo Horizonte. “A igreja de Cristo deve participar. Essa é uma causa nossa”, alerta o pastor. Para quem quiser saber mais sobre o trabalho do Credeq, está em busca de ajuda ou se tornar um voluntário, basta ligar para o telefone (31) 3461-4400. A triagem acontece no bairro Sagrada Família, na capital mineira.